Rio de Janeiro (RJ), 22 e 23 de julho de 2015

TEXTO DINAMIZADOR:

Vida nua e a barbárie nossa de cada dia

Por Márcia Gatto[1]

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Quais práticas e intencionalidades do poder dominante são direcionadas àqueles considerados excluídos, desnecessários, perigosos, indignos de viver no modo de produção capitalista? Quais as consequências disso? Para responder a essas perguntas, é necessário fazermos uma leitura aprofundada de movimentos, conexões e determinações estabelecidas, bem como de suas contradições, enquanto elementos do processo histórico. Para conhecer a realidade em sua totalidade, é necessário integrar os diferentes fatos da vida social; saber distinguir aparência de essência.

É necessário entender as conexões dos fenômenos com os processos históricos e as realidades sociais, assim como a produção de subjetividades que permeiam e dão sustentação às práticas do poder dominante2. Essas práticas se dão no enfrentamento da situação de rua de crianças e adolescentes, bem como de jovens da periferia e favelas – em sua maioria negros e pobres -, em muitas cidades brasileiras, com destaque à cidade do Rio de Janeiro.

Somente nesse contexto, que integra os diferentes fatos da vida social (enquanto elementos do desenvolvimento histórico) numa totalidade, é que o conhecimento dos fatos se torna possível enquanto conhecimento da realidade. (LUKÁCS, 2012, p.76).

Ao longo da história brasileira, a preocupação com as crianças pobres e abandonadas foi tratada de diversas maneiras e sob a responsabilidade de vários segmentos e instituições. As relações sociais, sejam com a família, a Igreja, o Estado ou outros segmentos da sociedade, perpetraram valores morais, religiosos e culturais, reproduzindo o sistema de dominadores e subjugados (Rizzini & Pilotti, 2009). Tratando-se de políticas públicas, clara é a distinção feita entre as crianças das diferentes classes, como se existissem duas infâncias.

As práticas adotadas pelo poder público do Rio de Janeiro, bem como em outras grandes metrópoles do mundo, para com a população empobrecida (mendigos, desempregados, sem-teto, crianças e adolescentes em situação de rua, etc.), pouco avançaram em sua filosofia e prática. Em pleno século XXI, observamos ainda a permanência e a manutenção de práticas arbitrárias e violentas, com viés higienista e racista, reforçadas pela mídia, na veiculação de notícias discriminatórias e criminalizadoras, que fortalecem o apoio de grande parcela da sociedade a essas práticas.

A Operação Rio Verão – implementada em outubro de 2014 no Rio de Janeiro, da qual fizeram parte as secretarias de Ordem Pública, Segurança Pública, Polícia Militar e Guarda Municipal – trouxe uma série de violações. Os governos estadual e municipal do Rio de Janeiro uniram-se num claro desrespeito à lei e ao estado de direito democrático, com a intensificação das operações. Denúncias foram feitas de arbitrariedade cometidas por policiais ao reprimirem e/ ou impedirem o direito de ir e vir de adolescentes “supostamente” perigosos.

Houve impedimento de entrarem em ônibus – muitas vezes quando entravam nos pontos finais de ônibus da zona norte e periferia com destino à zona sul (praia) – e retirada de adolescentes de coletivos, em blitz montada pela polícia militar (PM) nas ruas de acesso à Copacabana e Arpoador. Os principais alvos das operações são adolescentes negros e pobres, vindos de periferias e favelas do Rio. São medidas tidas como “ prevenção” ou “proteção”, segundo declaração de gestores da cidade. Eles também declararam que os adolescentes retirados dos ônibus eram levados para a delegacia ou abrigos, para averiguação de mandato de busca e apreensão, ou aguardavam a chegada dos responsáveis. A Defensoria Pública entrou com pedido de habeas corpus, a fim de garantir o direito de liberdade, de ir e vir das crianças e adolescentes e para impedir que policiais retirassem esses jovens dos ônibus. O Juiz da 1ª Vara da Infância, Juventude e Idoso também se manifestou no sentido de garantir o direito e a lei.

A mídia contribuiu para a instalação do medo e na produção de subjetividades sobre os “jovens perigosos”. Isso foi feito com a ampla e sistemática divulgação de imagens de roubos, furtos e arrastões nas praias e outras áreas da cidade, gerando um clima muito desfavorável aos jovens, objetos das ações, bem como estimulando a ação de “justiceiros”. Houve declarações de autoridades, como o governador, o prefeito e o secretário de Segurança Pública, afirmando que iriam continuar retirando essas pessoas dos ônibus, pois consideraram que adolescentes sem dinheiro, sem documentos, descamisados e de chinelos já tinham, por si só, uma “atitude suspeita”. Mais de 70 linhas de ônibus para a zona sul da cidade foram retiradas ou tiveram percurso modificado pelo prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes. Recentemente, a segurança pública tem usado o termo “vulnerabilidade” dos meninos/as para justificar a intervenção e/ou repressão policial.

A produção e a difusão da cultura do medo são um grande aliado para legitimar ações repressivas e criminalizadoras contra a chamada “classe perigosa”. A autora Vera Malaguti (2003) afirma que:

[…] no Brasil a difusão do medo do caos e da desordem tem sempre servido para detonar estraté­gias de neutralização e disciplinamento planejado das massas empobrecidas. (…) a hegemonia conser­vadora da nossa formação social trabalha a difusão do medo como mecanismo indutor e justificador de políticas autoritárias de controle social. (…) Historica­mente este medo vem sendo trabalhado desde a visão colonizadora da América, na incorporação do modelo colonial escravista e na formação de uma República que incorpora excluindo, com forte viés autoritário (MALAGUTTI BATISTA, 2003, p.23).

À margem dos direitos fundamentais e de políticas que respondam concretamente às suas reais necessidades, excluídos do acesso aos benefícios da cidade, com muito poucas ou quase nenhuma possibilidade de escolarização e qualificação profissional, milhares de crianças, adolescentes e jovens brasileiros se distanciam cada vez mais dos processos produtivos. Assim, aprofundam-se as desigual­dades e as dificuldades quanto às condições de uma existência social e cidadã plenas.

Indignos de Viver

Márcia – Daquela “época do extermínio”, muitos meninos que você atendeu já morreram?

Antônio Futuro[2] – Muitos, muitos, muitos. Eu tenho fotos e mais fotos lá em casa que não tem nenhum menino vivo mais.

No início da década de 1990, o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua (MNMMR) do Rio de Janeiro fez levantamentos de dados sobre os crimes de extermínio contra crianças e adolescentes no Estado do Rio. Um minucioso dossiê foi preparado ao longo de 1991 e entregue, no início de 1992, a organismos internacionais (Anistia Internacional, Comunidade Europeia, Organização das Nações Unidas – ONU –, etc.). O documento denunciava o assassinato de 470 crianças e adolescentes; 82,12% desses crimes (386) foram cometidos contra adolescentes entre 13 e 18 anos, do sexo masculino. A maioria era afrodescendente (pardos e negros) e, em 78,99% dos casos (371), foram utilizadas armas de fogo. A capital do Rio de Janeiro destacou-se nesse levantamento com 54,68% dos assassinatos (257), seguida pela Baixada Fluminense, com 28,72% (135 casos); 16,59% (78 assassinatos) ocorreram em outras regiões do Estado.

Pouco mais de um ano depois de ocorridas as denúncias de extermínio, em 23 de julho de 1993, aconteceu a chacina da Candelária. O episódio refere-se à execução de 8 jovens, de um grupo de cerca de 70 pessoas (crianças, jovens e adultos), ao amanhecer, aos pés do centro comercial e religioso da cidade do Rio de Janeiro. Mais uma vez, manchetes foram estampadas nas primeiras páginas dos jornais e televisões do mundo inteiro. Pela primeira vez, os autores de uma chacina ousaram executá-la numa região central, na capital do Rio de Janeiro. A “Cidade Maravilhosa” desnudou-se, mostrou o seu avesso e todos viram que ela não era tão maravilhosa assim.

Vida nua… Serão essas pessoas “matáveis”? O autor Giorgio Agamben, em seu livro Homo Sacer – o poder soberano e a vida nua, traz à luz o vínculo oculto que sempre ligou a vida nua – a natural e não politizada –, ao poder soberano, aquele que tem o poder de vida e morte, de fazer viver e deixar morrer. Agamben (2012) faz uma ligação com o Homo Sacer, uma figura do direito romano arcaico, um ser humano que podia ser morto por qualquer um impunemente, ou seja, um ser “matável”. Ele traz essa reflexão para os dias atuais, quando, segundo o autor, a política tornou-se biopolítica; o campo de concentração surge como o paradigma político da modernidade.

Soberana é a esfera na qual se pode matar sem cometer homicídio e sem celebrar um sacrifício, e sacra, isto é, matável e insacrificável, é a vida nua que foi capturada nessa esfera (AGAMBEN, 2012, p. 85).

Ao longo do tempo, o Rio de Janeiro tem apresentado um cenário de violação e de retrocessos extremamente graves em relação aos direitos humanos de crianças, adolescentes e jovens. Isso vale especialmente para os que estão em situação de rua e para os provenientes da periferia e de comunidades empobrecidas. Em 2015, o grande número de audiências públicas realizadas no período, aponta uma dura realidade: violência, repressão, encarceramento e extermínio, sobretudo da juventude pobre e negra, tem tido proporções altíssimas. De acordo com os dados do Mapa da Violência de 2015, os homicídios representam quase metade das causas de morte entre jovens de 16 e 17 anos. O estudo revela que 46% dos jovens mortos nessa faixa de idade foram assassinados no País. O Brasil é o 3º colocado no mundo em homicídios, especialmente de jovens entre 15 e 22 anos, em sua maioria negros e pobres.

Em 2013, último ano com dados disponíveis e divulgados em 2015, foram assassinados 10.520 crianças e adolescentes no Brasil. Isso resulta em uma média de 29 casos por dia[3], índice maior do que o de países em guerra! A maioria das vítimas era negra, do sexo masculino e foi atingida por disparo de arma de fogo. “É um número bárbaro, extremamente elevado”, afirma o sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, autor do estudo e coordenador do Programa de Estudos sobre Violência da Flacso (Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais), responsável pela série Mapa da Violência.

De acordo com o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado sobre o assassinato de jovens no Brasil, todo ano 23.100 jovens negros de 15 a 29 anos são assassinados. São 63 jovens negros assassinados por dia; um a cada 23 minutos[4] . Em entrevista para a Agência Brasil sobre o lançamento do relatório, o senador Lindbergh Farias (relator da CPI) afirmou que “o que existe hoje no País é uma política de extermínio da nossa juventude, em especial da nossa juventude negra, pobre, moradora das periferias. Hoje, nós temos no Brasil uma média de 60 mil homicídios por ano, 50% desses são jovens, 77% dos jovens são negros e moradores das periferias”.

Na chacina de Costa Barros, ocorrida no dia 28 de novembro de 2015, cinco jovens foram brutalmente assassinados pela polícia com 111 tiros (!!), no bairro do mesmo nome, na cidade do Rio de Janeiro. Os jovens, todos negros e pobres, tinham saído de carro para tomar um lanche e foram executados pelos policiais.

Terrorismo de Estado: marcas da violência policial

O relatório “Você matou meu filho – Homicídios cometidos pela polícia do Rio de Janeiro”, foi lançado pela Anistia Internacional, em agosto de 2015[5]. De acordo com o estudo, a imagem negativa associada à juventude, particularmente aos jovens negros que vivem em favelas, leva “à banalização e à naturalização da violência”. O documento aponta que as políticas de segurança pública no Brasil são marcadas por operações policiais repressivas em áreas pobres e, com frequência, com o uso de força letal, em especial contra pessoas suspeitas de envolvimento com grupos criminosos. “É uma prática recorrente, nestes casos, o desmonte da cena. Raramente tem perícia feita no momento em que as mortes ocorrem. O que temos com mais frequência é que rapidamente a polícia isola a área, retira o corpo e pronto”, disse o diretor-executivo da Anistia Internacional Brasil, Átila Roque, em entrevista à Agência Brasil[6].

O referido relatório é baseado em uma serie de homicídios praticados por policiais militares nos anos de 2014 e 2015 na cidade do Rio de Janeiro, sobretudo na favela de Acari. De acordo com o os dados, das 1.275 vítimas de homicídios decorrentes de intervenções policiais entre 2010 e 2013 na cidade do Rio, 95,5% eram homens, 79% eram negros e 75% tinha entre 15 e 29 anos de idade. Para a Anistia Internacional, o Brasil tem a polícia que mais mata no mundo. Em 2014, de acordo com o relatório, 15,6% dos homicídios tinham um policial envolvido.

A violência policial no Brasil, e em especial no Rio de Janeiro, carrega a marca da impunidade como regra, na maioria dos julgamentos envolvendo policiais. Um caso exemplar foi a chacina da Candelária, na qual os evolvidos na execução eram policiais militares. Duas décadas depois, o pivô da série de assassinatos, o soldado Vinícius

Emmanuel Borges, está foragido e outros dois PMs estão em liberdade, pois tiveram suas penas extintas. Mais recentemente, a conclusão do inquérito da morte do menino Eduardo de Jesus Ferreira, de 10 anos (morto no dia 2 de abril de 2015, no Complexo do Alemão, na zona norte do Rio), foi uma verdadeira “aberração”, segundo a Anistia Internacional. A investigação da divisão de Homicídios afirmou que os PMs que atingiram a criança agiram em legítima defesa ao tentarem se defender de traficantes. Ninguém foi indiciado[7]. Com a proximidade da realização dos Jogos Olímpicos, a letalidade policial cresceu 78%.

Diante de um cenário tão grave, de tanta violação e redução de direitos humanos, do avanço sistemático de práticas repressivas, arbitrárias e violentas, explicitadas com o aumento do número de encarceramentos, dos casos de extermínio de crianças, adolescentes e jovens, em sua maioria negros e pobres, a face oculta (?) do racismo e da barbárie de nossos tempos é demonstrada, bem como as contradições e a incapacidade do Estado brasileiro, como garantidor de direitos igualitários para todos. O modo de produção capitalista mostra que não é possível sermos iguais e felizes ao mesmo tempo.

Referências Bibliográficas

ABRAMOVAY, P.; BATISTA, V. M. Depois do grande encarceramento. Rio de Janeiro: Revan, 2010.

AGAMBEN, Giorgio. Estado de Exceção. São Paulo: Boitempo, 2004.

____________ Homo Sacer. Belo Horizonte/MG: Editora UFMG, 2012.

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COIMBRA, Cecília. Operação Rio: o mito das classes perigosas. Niterói/RJ: Intertexto, 2001.

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LOWY, M. Ideologias e Ciência Social. São Paulo: Cortez, 2010.

LUKÁCS, G. História e consciência de classe. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2012.

MALAGUTTI BATISTA, V. O Medo na cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Revan, 2003.

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MARX, K. O Capital. São Paulo: Edição Popular, 1979.

________ O Capital: crítica da economia política. V. 1. T. 1. São Paulo: Abril Cultural, 1983.

________ Manuscritos Econômicos Filosóficos. São Paulo: Editora Martin Claret, 2001.

MENEGAT, M. O olho da Barbárie. São Paulo: Expressão Popular, 2006.

RIZZINI, Irma; RIZZINI, Irene. A institucionalização de crianças no Brasil. Rio de Janeiro: Loyola, 2004.

97

RIZZINI, Irene; PILOTTI, Francisco (Org). A arte de governar crianças. São Paulo: Editora Cortez, 2009.

WACQUANT, L. As prisões da miséria. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

________________ Punir os pobres. Rio de Janeiro: Revan, 2007.

WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da violência 2015. Disponível em: http://bit.ly/1CIONXS. Acesso em 04 ago.2016.

[1] Márcia Gatto é jornalista, doutoranda em Políticas Públicas e Formação Humana, mestre em Políticas Públicas e Formação Humana (PPFH/UERJ) e coordenadora da Rede Rio Criança.

[2] Antônio Futuro, Pedagogo, mestre em Educação e educador social, militante do movimento social em defesa da criança e do adolescente desde meados da década de 1980.

[3] Disponível em http://bit.ly/29dcIYL. Acesso em 30 jun.2016.

[4] Disponível em: http://bbc.in/1t2WGXk. Acesso em 06 jun.2016.

[5] Disponível em: http://bit.ly/2ayIlyS. Acesso em 10 ago. 2015.

[6] Disponível em: http://bit.ly/2az40UV. Acesso em 04 ago.2016.

[7] Disponível em: http://glo.bo/2aHy3HZ. Acesso em 03 nov.2015.

 

 

PÚBLICO PARTICIPANTE:

Da Vigília das Mães, missa e ato inter-religioso, caminhada e ato público na Cinelândia, estiveram presentes 1.400 pessoas. Dentre os presentes, estavam conselheiros nacionais do Conanda, militantes de movimentos, como Candelária Nunca Mais; Movimento Moleque; Mães de Maio; Amanhecer contra a Redução da Maioridade Penal; membros de outros movimentos sociais; entidades ligadas à defesa dos direitos da criança e do adolescente; e do Poder Judiciário. Além deles, militantes dos movimentos de mães do Rio de Janeiro e de São Paulo, crianças e adolescentes de grupos como a Pastoral do Menor, líderes religiosos – espíritas, umbandistas, católicos, evangélicos e judaicos -, e autoridades, como o ministro da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), Pepe Vargas; a secretária de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos, Teresa Cristina Cosentino; o desembargador Sirio Darlan; lideranças partidárias; parentes e amigos de mortos em outras chacinas.

Da audiência pública Jovens vítimas da violência e Justiça Reparadora para Familiares, participaram 120 pessoas. Dentre elas, os conselheiros nacionais do Conanda, militantes de movimentos como: Candelária Nunca Mais; Movimento Moleque; Mães de Maio; autoridades, como o ministro da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), Pepe Vargas; a secretária de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos, Teresa Cristina Cosentino; o desembargador Sirio Darlan; lideranças partidárias; parentes e amigos de mortos em outras chacinas.

TEMÁTICAS:

  • Redução da maioridade penal.
  • Violência policial.
  • Participação.
  • Mobilização social.

 

OBJETIVOS:

  • Desenvolver estratégias de criação de novas redes de promoção e defesa dos direitos humanos das crianças e adolescentes, incluídos os movimentos e governos locais.
  • Capacitar lideranças do movimento social, especialmente aqueles que participam de movimentos da sociedade civil contrários à redução da maioridade penal.

 

COMO FOI:

A Vigília – A primeira ação dessa atividade foi a Vigília das Mães do Movimento Candelária Nunca Mais. Fátima Silva, uma das fundadoras do Movimento Candelária Nunca Mais, explica que a Vigília está no seu sexto ano. Ela surgiu da necessidade de se criar um espaço para trabalhar o sofrimento das mães, que se emocionavam muito durante as missas anuais para marcar o aniversário da chacina.

Missa e ato inter-religioso – Uma missa e um ato inter-religioso acontecem todos os anos no aniversário da chacina, com o objetivo de lembrar as vidas que se foram, vítimas do extermínio. No altar da Igreja da Candelária, faixas, banners, camisetas, fotos e objetos “contaram” trechos das histórias desses meninos. Cerca de 1.400 pessoas participaram. Dentre elas, militantes dos movimentos de mães do Rio de Janeiro e São Paulo; crianças e adolescentes de grupos como a Pastoral do Menor; membros de movimentos dos direitos humanos; líderes religiosos; e autoridades, como o então ministro da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), Pepe Vargas; o vice-presidente do Conanda, Carlos Nicodemos; a secretária de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos, Teresa Cristina Cosentino; o desembargador Sirio Darlan; e o deputado federal Alessandro Molon (PT-RJ).

Caminhada e ato público – Após a missa, o grupo saiu da igreja da Candelária e desceu a Avenida Rio Branco a pé até a Cinelândia, na “Caminhada em Defesa da Vida”. Durante a caminhada, autoridades, militantes, crianças e jovens entoaram palavras de ordem como “Basta! É hora de acabar com essa violência”. Um grupo do Projeto Circo Baixada, que promove a inclusão social por meio da arte circense, interagia com manifestantes e transeuntes.

Audiência pública – A audiência discutiu o enfrentamento da letalidade infanto-juvenil e as medidas de reparação às famílias de vítimas de violência praticadas por agentes do Estado. Isso equivale a dizer que ocorrem no país 3,5 Candelárias todos os dias. Esses são dados do Mapa da Violência 2015: Adolescentes de 16 e 17 anos do Brasil[8], apresentados pelo sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, da Flacso Brasil durante a audiência Jovens vítimas da violência e Justiça Reparadora para Familiares, dia 23 de julho, no Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro. Na audiência, o ex-ministro da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), Pepe Vargas, avaliou que o Brasil precisa de formas mais efetivas para encarar grupos de extermínio e as políticas antidrogas.

Mônica Cunha, do movimento Candelária Nunca Mais e fundadora do Movimento Moleque, um movimento de mães pelos direitos dos adolescentes no sistema socioeducativo, falou sobre a necessidade reparação financeira e apoio psicossocial aos familiares das vítimas.

O desembargador Sirio Darlan avaliou que essa é uma boa medida também para combater a violência contra a juventude. “Se o Estado começar a ser acionado, mexer no seu tesouro e nas suas economias, eles vão ter que se organizar para evitar essa violência”, disse, lembrando que o fato de o ECA não ter sido plenamente efetivado nos seus 25 anos de existência faz com que os conservadores responsabilizem a lei pela violência e as principais vítimas, os jovens, sejam apontados como os algozes.

Teresa Cosentino, secretária de Assistência Social e Direitos Humanos do Estado do Rio de Janeiro, falou que o órgão está desenhando um programa de atendimento psicossocial e financeiro para que toda a população saiba e tenha acesso ao serviço. Ela citou o bem-sucedido atendimento no “caso do menino Eduardo”, quando a indenização saiu em menos de 60 dias. A secretária também apontou a necessidade de reverter o ciclo de violência por meio da educação em direitos humanos.

Pepe Vargas, falou da importância de levar o debate sobre reparação para o maior número de cidades no País. Ele avalia que é preciso ter formas mais efetivas de encarar grupos de extermínio e políticas antidrogas, não apenas por meio de abordagens de Segurança Pública.

Carlos Nicodemos, vice-presidente do Conanda, entende que a aprovação do Projeto de Lei (PL) na Câmara dos Deputados pela redução da maioridade penal foi uma derrota. Ela afeta “especialmente o segmento de adolescentes e jovens negros, colocados secularmente nessa estrutura de vitimização”. Os participantes da audiência pública destacaram que no Congresso Nacional tramitam propostas legislativas que ameaçam o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Nunca mais

Há 22 anos, era noite de 23 de julho de 1993. Foi quando policiais militares atiraram contra mais de 70 crianças e adolescentes sem-teto que dormiam nas proximidades da Igreja da Candelária. Oito deles (abaixo), com idades entre 11 e 19 anos, foram mortos no massacre. Mais de duas décadas depois, a violência contra os jovens, principalmente pobres e negros, continua crescendo. Dados do Mapa da Violência 2015: Adolescentes de 16 e 17 anos (abaixo) do Brasil mostram que o homicídio é a principal causa de morte de adolescentes nestas idades. Seis PMs foram julgados pela chacina. Três foram absolvidos. Os condenados, Nelson Oliveira dos Santos Cunha, Marcus Vinícius Emmanuel Borges e Marco Aurélio Dias de Alcântara, foram expulsos da corporação. Hoje estão em liberdade, beneficiados pela progressão de pena.

Chacina da Candelária: + 23/07/1993

  1. Paulo Roberto de Oliveira, 11 anos
  2. Anderson de Oliveira Pereira, 13 anos
  3. Marcelo Cândido de Jesus, 14 anos
  4. Valdevino Miguel de Almeida, 14 anos
  5. “Gambazinho”, 17 anos
  6. Leandro Santos da Conceição, 17 anos
  7. Paulo José da Silva, 18 anos
  8. Marcos Antônio Alves da Silva, 19 anos

  

NÚMEROS: 

Mapa da Violência 2015: Adolescentes de 16 e 17 anos do Brasil[9] 

  • 3,5 Candelárias por dia: 10.136 mil homicídios de crianças e adolescentes em 2013, entre 11 e 19 anos, mesma faixa etária das oito vítimas do massacre ocorrido no Rio de Janeiro em 1993.
  • Os homicídios aumentaram 426,9% entre 1980 e 2013, sendo que o perfil das vítimas é predominante de pessoas negras, pobres e com baixa escolaridade.
  • 46,0% dos jovens mortos em 2013 foram assassinados, uma média de 10,3 assassinatos por dia.
  • A taxa nacional de homicídios na faixa de 16 e 17 anos de idade, em 2013, foi de 54,1 homicídios por 100 mil adolescentes.
  • Dos 3.749 adolescentes que, em 2013, foram assassinados, 93,0% eram do sexo masculino. Morreram 3 vezes mais negros do que brancos.

 

Você matou meu filho[10]

  • O Brasil é o país com o maior número de homicídios do mundo: 56 mil em 2012. Desses, 30 mil eram jovens, dos quais 77% eram negros.
  • Entre 2005 e 2014, foram registrados no Estado 8.466 “homicídios decorrentes de intervenção policial”, sendo 5.132 somente na capital. Embora tenha havido uma tendência de queda a partir de 2010, entre os anos 2013 e 2014 houve aumento de 39,4% do número de autos de resistência no Estado, e de 9,0% na cidade do Rio de Janeiro.
  • 99,0% das vítimas dos homicídios decorrentes de intervenção policial na cidade do Rio de Janeiro são homens. Desses, 79% são negros e 75% são jovens.
  • Em 2012, a maioria (54,8%) dos presos tinha até 29 anos.

 

Mapa do Encarceramento[11]

  • O Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo, com 715.655 presos. Ela aumentou 74,0% entre 2005 e 2012.
  • Os homicídios são hoje a principal causa de morte de jovens de 15 a 29 anos no Brasil e atingem especialmente jovens negros do sexo masculino, moradores das periferias e áreas metropolitanas dos centros urbanos.
  • A faixa etária que mais foi presa estava entre 18 e 24 anos.
  • Em 2012, os negros foram presos 1,5 a mais que brancos.
  • 70% dos crimes que motivam prisões são relacionadas às questões patrimoniais e drogas; crimes contra vida motivam apenas 12% das prisões.

 

PARCEIRO:

  • Movimento Candelária Nunca Mais

 

HASHTAGS:

#‎CandelariaNuncaMais

#MaisDireitosMenosPunição

#‎MapadaViolencia

#EnvagélicosContraaRedução

#NãoàReduçãodaMaioridadePenal

 

O QUE LEVAMOS:  

“Estão aqui mães que conseguiram fazer uma passagem do luto para a luta, uma luta legítima”.  Fátima Silva, uma das fundadoras do Movimento Candelária Nunca Mais, fala sobre a Vigília.

“O caso candelária revela que a efetivação do mais importante direito da criança e do adolescente, o direito à vida, ainda é um desafio para o Estado. O extermínio de jovens demarca o quanto ainda está inacabado o processo de efetivação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)”. Carlos Nicodemos, vice-presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).

 —

[1] Enquanto poder dominante considero, principalmente, o poder público (governos estadual e municipal) e a mídia. Enquanto práticas do poder dominante, destaco o recolhimento, o encarceramento e o assassinato de crianças, adolescentes e jovens negros e pobres, especialmente dos que se encontram em situação de rua e dos provenientes das favelas e periferias dos grandes centros urbanos, com destaque para o RJ.

[2] Antônio Futuro, Pedagogo, mestre em Educação e educador social, militante do movimento social em defesa da criança e do adolescente desde meados da década de 1980.

[3] Disponível em http://bit.ly/29dcIYL. Acesso em 30 jun.2016.

[4] Disponível em: http://bbc.in/1t2WGXk. Acesso em 06 jun.2016.

[5] Disponível em: http://bit.ly/2ayIlyS. Acesso em 10 ago. 2015..

[6] Disponível em: http://bit.ly/2az40UV. Acesso em 04 ago.2016.

[7] Disponível em: http://glo.bo/2aHy3HZ. Acesso em : 03 nov.2015.

[8] Mapa da Violência 2015. Disponível em: http://bit.ly/2aKTGqu. Acesso em: 07 ago.2016.

[9] Disponível em: http://bit.ly/2aKTGqu. Acesso em: 07 ago.2016.

[10] Disponível em: http://bit.ly/1EDQsSW. Acesso em 07 ago. 2016.

[11] Disponível em: http://bit.ly/1iHH3Qv. Acesso em: 07 ago.216.